Este texto é sobre meu vizinho. O conheço desde minha infância, esta já um pouco distante. Desde aquele tempo ele sempre foi triste. Se comunicava com os olhos e parcas palavras. Não era à toa, afinal seu pai alcoólatra batia constantemente em sua mãe. Somo a esse constrangimento, o fato de seu irmão ter problemas mentais, claramente piorados pelo comportamento do pai. As crianças da rua, cruéis que são (não sei de onde tiram que crianças são seres puros....) sabiam disso, riam além de abusar do seu irmão e ainda faziam piadas sobre sua mãe. Frente a tudo isso, como encarar a vida, a rua, a própria existência? Eu em minha casa mais estruturada, com meus problemas infinitamente menores, sempre me incomodei de ter uma vida mais branda que a dele, apenas separados por um muro. Não me falem de ventre, famílias diferentes e toda uma proposta biológica ou religiosa. O que separava a felicidade de um e a tristeza do outro era tão somente, um muro. Quantas vezes me senti constrangido com a possibilidade dele ouvir gargalhadas da minha casa, contrastando com o ambiente hostil que ele tinha.
Hoje somos adultos, seu pai já faleceu e a família continua com ele, a mãe e o irmão. Na rua, ele sempre de tez baixa, apenas responde ao meu cumprimento com o levantar de uma sobrancelha, continuando a andar com suas roupas acinzentadas e discretas. Meus acenos eram sinal de respeito e certa admiração por nunca se revoltar e seguir um rumo desastroso. Porém reparei que talvez ele prefira passar batido, sem ter que encarar alguém com as marcas do passado nos olhos. Que seja assim, sem bom dia, sem acenos nem cumprimentos.
Sem mais.
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